15.4.07

Educar...

“Eu poderia ser uma adolescente normal se não tivesse uma família formada por onze pessoas.
Eu deveria ter sido uma criança normal se não fossem as responsabilidades que eu cumpria.
Eu deveria gostar do que faço se não fosse obrigada a fazer.
Eu deveria freqüentar ambientes de lazer se não tivesse que trabalhar.
Eu deveria reclamar quando dizem algo que não gosto, se não tivesse inspiração para descrever cada situação.
Eu poderia reivindicar quando sou julgada injustamente, mas calo-me e a humildade prevalece.
Eu deveria ter uma péssima impressão da vida se não fosse a paixão que tenho pela arte de viver”.

Valéria, 16 anos, Manari, Sertão de Pernambuco (Tirado do documentário “Pro Dia Nascer Feliz” de João Jardim)

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Educar é mais que impor uma cultura dominante, educar é mais do que travar uma guerra com o aluno e dizer a ele como deve agir e se portar, educar é engolir seu orgulho e não desanimar de sua tarefa, educar é amar e respeitar a subjetividade alheia, ainda mais quando essa é tão nova no mundo e tem tanto a descobrir... Educar é uma troca entre o mestre e o aluno, onde deve-se buscar o equilíbrio, como um abraço, onde os dois necessariamente dão e recebem na mesma proporção, ao mesmo tempo e em um só toque.

Compreender o mundo daqueles a quem chamamos de alunos, perceber que até seus defeitos podem levar a descobrir que a vida pode ser diferente, não esquecermos quem já fomos um dia... É um desafio. Sem aprendermos com nossos alunos, sem entrarmos no mundo deles e acima de tudo sem enxergarmos a todos como seres humanos, de certa forma perdidos com um mundo confuso e com informações demais não conseguiremos nenhum progresso.

Como você se sentiria se estivesse há pouco tempo nesse lugar e já estivesse frente a tantas obrigações, imposições... Faça isso, faça aquilo, aprenda isso, esqueça aquilo... Mas por que? Eu só quero me divertir... Não é pra ser assim? Não? Sim, vocês todos têm razão... Sétimas, oitavas, primeiros, segundos, terceiros... As salas organizadas em A, B, C, com seus Andrés, Vanessas, Thiagos, Danielas... São nomes que passam pela lista de chamada todos os dias, são pessoas que tem uma vida inteira pra viver e muitas dúvidas na cabeça, mas uma certeza: viver é bom e deve ser prazeroso. Nisso vocês estão certíssimos!

Começo agora como educador. Acho que comigo vocês ainda não aprenderam muito, mas agradeço por tudo o que em tão pouco tempo aprendi. Sinto vontade de enfrentar a barra diária do trabalho pouco remunerado e reconhecido, a sala dos professores empoeirada e tão contraditória, mas com a vontade mesmo que embrutecida de professores que reclamam sim, mas ainda permanecem em seus postos e colhem de forma caótica, imprevisível e deliciosa as alegrias, os desânimos, os choros, as recompensas de fazer parte das vidas desses que amanhã farão desse mundo algo que nós torcemos que seja muito melhor do que nossas gerações fizeram e ainda fazem... Devemos educar mostrando onde erramos, devemos amar no erro de talvez não termos aceitado um dia o amor daqueles que nos tentaram ensinar que algo muito grande nos esperava. O mundo será todo de vocês... A cada minuto que passa vocês se apossam ainda mais dele!

Educar é amar a humanidade, é amar cada sorriso de 14, 15, 16, 17 anos... Educar para mim não é nada fácil, mas a cada dia que acordo penso que posso fazer diferente e ainda melhor. Agora estou feliz e posso enfim voar... Não sei o que fazer, mas a tentativa me seduz e sigo em frente. Por mim, por nós... Até o fim.

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