3.1.07

Cavando

O que as pessoas pensam? Perguntava-se... Qual o motivo de fazerem o que fazem? Ora, por que diabos tentar entender essas coisas era a maior pergunta. Teria alguma utilidade?
Não havia mais o que fazer aquele dia e o que mais procurava entender era por que diabos as coisas andavam naquele pé. Claro que se fez o que fez era óbvio que as coisas estariam dessa forma, mas sabemos que um fato nunca é auto-sustentável. A não ser que se descubra a raiz de tudo.
O que as pessoas pensam de mim? Era a próxima pergunta. Talvez ao descobrir isso descobriria a chave de todo o resto. A raiz tão procurada. Então era necessário cavar. Cavar o que? Cavar a mim mesmo ou aos outros? Cavar o nada talvez... Mas já estava cansado de cavar o nada e num grito interno procurava cavar alguma verdade enterrada onde ele ainda não sabia.
Estaria nele a raiz? Sua individualidade se realizaria de uma forma que transformasse o que os outros pensam em relação a ele? Talvez... O simples fato de ser o que é para os outros faria com que pensassem algo sobre ele. Isso de certa forma cheirava a convencimento, pretensão... As pessoas não gostavam disso. A possibilidade de controlar o mundo através de sua própria vontade, instabilidade, ignorância ou loucura descarrilada ou controlada parecia por demais um convencimento. Era isso... Mas convencer a quem? Aos outros ou a ele mesmo? A resposta seguinte o guiaria para a superação do primeiro problema.
Passava a vida a tentar agradar e vivia com a cabeça em outro plano. Entendia as coisas por cima, mas não era convencimento ainda. Era só distração. Distração essa que durante muito tempo o atrapalhou e só a partir de um certo momento da vida passou a guiá-lo. Lá de cima ele via o mundo e acenava para que esse mundo sorrisse para ele. Lá do alto não sabia como gritar e começou a despertar em si o medo de acenar e acenar até debruçar-se sobre suas nuvens concretas de sonhos e cair... Como seria a queda? Não sabia, mas gostaria muito de saber, embora não soubesse como pular.
Convencer lá de cima... Tarefa difícil. Acho que não é convencimento. Acho que é pedido de socorro mesmo. Como alguém encontra a outro aqui em cima? Como alguém conhece o medo de quem não está presente? A cada passo passou a perceber que os outros pensavam dele aquilo que ele mesmo queria, mas algo ainda havia de errado. O convencimento ainda o incomodava. Convencer a quem está longe? Convencer de que aqui é melhor ou convencê-los a me deixarem aqui e pensarem bem de mim? Convencimento de si mesmo... Sim, talvez estivesse tentando se convencer. Convencido... Convencido! Sim, ele era mesmo, mas isso não o salvava. A prisão não estava nele. A prisão estava nos outros. A pergunta está feita e escolhida. Ao menos o convencimento o ajudava em algo nesse momento.
O que as pessoas pensam? Se descobrisse, talvez chegasse à raiz que agora era descoberta apenas em superficialidade. A raiz está nos outros, mas em que lugar deles? O que os outros pensavam dele não estava totalmente preso ao seu conhecimento, mas talvez não devesse estar, caso contrário teria diferença entre o que pensa ele e o que os outros pensam?
Mas não importa só o que os outros pensam dele, importa também o que pensam delas mesmas e do mundo. Então o que as pessoas pensam sobre elas também importa? Bom, agora o que penso de mim também importa, então... Perdeu-se a raiz novamente.
Há algo que se encontra em todas essas questões: O pensar! Sim, o pensar, portanto não importa o que se pensa de si mesmo, dos outros ou das coisas, mas sim o que se pensa do próprio pensar.
A raiz era essa e estava o tempo todo na sua frente. O pensar o constituía em uma troca intensa e extasiante. A existência mútua que o pensar chamaria através das palavras de coexistência. O pensar que faz com que sejamos o que quisermos e o que não quisermos. O pensar que em um instante torna-nos reis e em outros torna-nos plebeus. O pensar.
No fim da tarde não mais pensou. Agora que achou a raiz talvez deva esquecê-la por algum instante. Convencimento... Sim, me convenço pelo meu próprio pensamento e devo salvar a mim e a ele para que obrigatoriamente ambos possam salvar-se. Não pensou naquele instante. Talvez para poder sair fora de todo esse pensar e analisá-lo de longe e fora dele ao mesmo tempo, não deixando de fazer parte dele e o pensar fazer parte de si mesmo.
Analisou-o como quem analisa um inseto frente à lente ampliadora. Não o deixaria voar. Não o deixaria enterrar-se novamente. O pensar é tão magnífico, o pensar é tão incrível e seguro de si que permite até mesmo que possamos sair dele. O pensamento sabe que não há salvação individual e sabe que não há como sair, mas há como voltar.
Não importa mais a questão sobre quem pensa o que sobre quem agora. Só importa o pensamento. Só importa a compreensão do que é a própria compreensão muda, mas de grito imperecível e vibrante.
Não queria mais ser nada. Só queria pensar. Não mais estava no alto. O convencimento dele era seu próprio pensar. Agora com os pés no chão acenava para cima e compreendia que nada era ruim. Apenas o fato de não saber o que havia acabado de se convencer ser a raiz da sua questão, mas não se convenceu de que havia encontrado a chave e então mais uma vez parou e pensou. Pensar não era a raiz... De início decepcionou-se, mas ao olhar para trás percebeu o caminho que havia seguido e alegrou-se.
Convenceu-se que deveria seguir e descobrir afinal de contas em que lugar o pensamento poderá encontrar a tal chave. Olhou para frente e não viu nada. A cegueira mostrou algo nunca antes visto, mas que ainda não se converteria em palavras. Não importa, pois lembrava que lá de cima não havia o que dizer. Mais uma vez quis descer e sabia como encontrar a escada, não mais pensaria em pular. A escada estava em algum lugar... Assim seguiria. Com a cabeça nas nuvens e os pés no chão, pois nem toda raiz é formada apenas de chão e nem toda nuvem forrada de convencimento é etérea como a palavra não dita que espera ansiosamente sua forma que um dia será pensada e isso por si daria total consistência ao fato que inicialmente aparecia como insustentável por si. Autonomia essa dada pela chave de toda a questão, embora ainda desconhecida.

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