11.11.07

Para Além do Bem e do Mal

A moral da religião cai sobre nossas cabeças como um martelo. Quem crê em um deus, seja ele qual for: um deus calcado nas regras morais da conduta humana, um deus que aparece como a verdade do universo, sofre e carrega consigo a dor de pautar sua conduta nos mais diversos aspectos da vida.

Creio em Deus... No meu caso é o Deus dos cristãos. Algo quase lógico para alguém que nasceu no país em que nasci, respirando a cultura que respiro. Não há problemas em relação a essa tradição cultural. Admito! Creio em Jesus Cristo e em suas regras morais. Não sou praticante do catolicismo, nem do protestantismo: sou um espírita! Creio na sobrevivência da alma em detrimento do corpo material, creio na evolução progressiva do espírito dentro de uma ordem hierárquica que vai levando esse viajante evolutivo cada vez mais alto na ordem divina.

Creio, mas não me sinto feliz... O espiritismo é cristianismo, assim como o catolicismo e o protestantismo. A diferença vem da interpretação e dos métodos encontrados nessa religião. O mestre é o mesmo. A moral cai sobre mim, as questões acerca da minha conduta me transformaram em alguém que muitas vezes está no mundo, participa dele, mas não consegue de fato interagir.

O verdadeiro cristão não é feliz nesse mundo. Não que eu seja um exemplo, mas exatamente pelo fato de não ser um exemplo, me condeno. Condeno-me em todos os aspectos da vida, tanto social como interna. Cobro de meu espírito toda a conduta necessária para realizar minha tarefa neste lugar. Sei que não faço o suficiente, mas minha ciência frente a esse fato e minha ignorância frente a minha conduta criam um paradoxo angustiante.

A todo instante vejo as pessoas negarem a verdade da religião, fugirem de seus fundamentos e, com isso, criarem para si mesmas uma carga cada vez maior de conseqüências negativas para seus corpos e mentes. Esse é o fundamento básico da minha religião: quem o mau faz, para si o faz!

Eu também faço o mau... Eu também me prejudico, por isso sofro. Sou impotente frente às provas colocadas ao meu ser; sou ignorante e fraco. Reconheço tudo isso, mas em momento algum consigo aliviar meu espírito em relação ao mundo. Nem mesmo a humildade – que também assumo ser falha em muitos momentos – me tira da dor cristã. Sim, a dor cristã de cobrar-se o tempo todo, de buscar seguir o Mestre e perceber que o afastamento dEle é constante e gradativo. Sou inconstante e negativo muitas vezes, mas em outras sinto a bondade brilhar em meu âmago. De que adianta? Não enxerguei nada até o momento...

Estou cansado de lutar para pautar-me frente ao infinito. Estou cansado de me espelhar numa metafísica estranha. Meu coração está apertado frente à minha fé diminuta. Ainda acredito em Deus, ainda acho que a bondade, a caridade e o amor ao próximo são os faróis do mundo, mas não sei exatamente o quanto sei sobre isso. Não sei exatamente até que ponto o que afirmo acerca disso é fundamento ou discurso vazio. Não sei muita coisa. O sofrimento ensina, bem dizem os espíritas. A plantação é arbitrária, mas a colheita obrigatória. E assim sigo meu caminho... Sofrendo e reconhecendo que, se sofro, é porque errei. O problema é que sinto que até mesmo quando acerto não estou certo. O mundo, as pessoas em minha volta, na maioria das vezes não refletem aquilo que eu deveria ser. Se estou perto dessas pessoas, é porque minha conduta assemelha-se à conduta delas, de modo que percebo que não consigo mais compreender o que há de errado com minhas atitudes, minha vida, minha fé.

Essas linhas estão confusas, mas de outra forma não poderia ser: quem as escreve está confuso. Na verdade não quero mais essas questões morais se abatendo sobre minha vida, não quero mais ser pautado pela metafísica. Não quero mais isso! O problema é que estou preso pela crença no divino, fui contaminado pela cultura ocidental, pela fé cristã da vida eterna e da piedade.

Não quero me transformar em um Nietzsche, não quero negar a humanidade. Na minha opinião, Nietzsche dizia afirmar a vida, - ao contrário dos cristãos, como ele afirmou - mas esse, da mesma forma a negava: negava por se esconder do convívio social, por acreditar ser um ser por demais evoluído, por estar frente a seu tempo. Esse homem esqueceu que a vida é o mundo; a vida não é o que está em uma filosofia em si, nem no que ainda há por vir. Eu não quero negar a vida, não quero me distanciar das pessoas e seus defeitos morais.

Talvez meu problema seja julgar demais os outros, mas sei a que isso se deve! Deve-se ao fato de que, na medida em que trago para mim a tarefa se cumprir a conduta cristã, torno-me um juiz do mundo. Sei que erro nesse sentido; sei que não é nada disso que o Mestre pregou, mas tomo isso como uma doença em mim. Mas nem mesmo sei sé é esse o problema. Deve ser mais que isso.

Estou no calvário. Mas quero sair dele! O consumismo, o culto ao objeto, o “cada um por si” funcionam muito para os outros. Sei que todos sofrem de um modo ou de outro, mas a tentativa de seguir o cristianismo não me trouxe nem conforto material e nem tranqüilidade espiritual. Os espíritos evoluídos dirão que se trata de um momento em que devo aprender. Talvez seja, mas se tenho vontade de ser de outra forma, se essa forma for errada e isso for me trazer dor... Aceito a condição! Eu quero paz, mesmo que artificial! Alguma dose dessa paz! Enquanto o divino não me tocar...

Ainda sobre Nietzsche, acho que em um momento ele foi brilhante: o bem não me trouxe conforto, o mal tão pouco. Quero me projetar para fora disso; quero fugir dessa tradição dualista! Quero estar para além do bem e do mal! Sou uno, e aceitar essa condição é negar esse ser uno, mas mutável: paradoxo fundamental para se compreender minha relação com o mundo. Relação essa extremamente confusa e problemática!

Viver é buscar a liberdade... Ao menos para os pobres diabos que caem no questionamento acerca da própria vida!

3 comentários:

rafael andolini disse...

não quer ser um novo nietzsche porque? ele tinha um bigode tão bonito!

rafael andolini disse...

extra, extra!!!heráclito com infecção no ânus come cascão!!!

PAULO disse...

Sabia que vc iria fazer uma boa Dialética por fim das contas! estar para além do bem e do mal não significa abandonar o sagrado e o profano, mas, ficar com o que tem de bom dos dois, amar a vida e querer o bem do humano e do melhor para nosso convívio social.